SPM-SC
Aulas de português como espaço de afeto: experiência docente na Pastoral do Migrante
Por Natalia Benatti Zardo
Professora voluntária na Pastoral do Migrante de Florianópolis/SC

Em outubro de 2019 completei um ano atuando como professora voluntária na Pastoral do Migrante de Florianópolis. Neste período, conheci muitas pessoas que nos procuravam com um objetivo principal: se aproximar da língua portuguesa. Por estarmos sempre abertos à chegada de novos estudantes, a cada semana pelo menos uma nova pessoa se junta ao grupo.
Cerca de 160 pessoas de diferentes idades, vindas de países como Haiti, Venezuela, Colômbia, Síria, Egito, Argentina, República Dominicana e Estados Unidos, já passaram pelas aulas oferecidas gratuitamente na Pastoral do Migrante. Localizada na Paróquia Santa Teresinha do Menino Jesus, as aulas acontecem todas as segundas-feiras das 19h às 21h. Com a chegada de um grande número de venezuelanos no início de 2019, eles se tornaram a segunda nacionalidade com mais estudantes, após os haitianos.
Tal qual a dinâmica dos fluxos migratórios, as turmas se caracterizam pelos movimentos de pessoas. Alguns estão conosco há um ano, alguns partiram para outras cidades, para outros cursos, conseguiram empregos noturnos, e outros ainda continuam chegando. Em dezembro de 2018, encerramos as aulas com um grupo de 15 estudantes. Atualmente temos dois grupos com a média de 40 estudantes regulares. Neste um ano de aula, a nossa equipe de professores também cresceu.


Organizadas por uma equipe de professoras voluntárias multidisciplinar, as aulas têm o caráter do acolhimento como característica principal. Buscamos através da nossa sensibilidade docente compreender as demandas, dificuldades e anseios de cada vida que se junta ao grupo. Entendemos que a partir disso poderemos melhor desenvolver e criar estratégias educativas que contemplem as diferenças e promovam a interculturalidade.
No entanto, este é ainda um grande desafio que nos motiva a seguir nos questionando: como as aulas de português podem se constituir como espaços de afeto? como construir aulas de português que sejam mais abertas e flexíveis? Que sejam sensíveis? Que proporcionem momentos de leveza, que construam amizades e fortaleçam as redes de apoio?

O elo de amizade, respeito e parceria construído a partir dos encontros nas aulas é o que mais me encanta em toda minha experiência de professora de pessoas migrantes. Entre uma conversa e outra sobre verbos, regras gramaticais e vocabulários diversos, compartilhamos também experiências de vida e diferentes conhecimentos de mundo.
Aqueles que estão mais tempo na cidade também auxiliam na recepção dos recém-chegados e, assim, as aulas se tornam um espaço de troca de informações: como procurar emprego, como conseguir certos documentos, onde morar, qual ônibus pegar. Além disso, nossas duas horas de aula são sempre preenchidas com algumas risadas. E é nestas gargalhadas em comum que já sabemos que estamos falando o mesmo idioma. O do afeto.

As convivências das aulas fazem com que o objetivo principal de apenas aprender um novo idioma seja ressignificado. Nas aulas da Pastoral nós buscamos, de certa forma, amenizar os duros processos migratórios que exigem tantas mudanças e enfrentamentos diários de barreiras físicas, políticas e sociais. Ao contribuir para que espaços como estes existam e resistam, em uma sociedade que cotidianamente repele estas pessoas para lá das fronteiras, estamos certamente ajudando a subverter uma lógica de exclusão que nosso mundo ainda propaga.
Agradeço imensamente à Pastoral do Migrante por esta oportunidade única de poder crescer enquanto ser humano e aos meus estudantes que tanto me ensinam sobre a vida.
